Lojistas e clientes chegam comedidos às festas de fim de ano. Até houve aumento no movimento em ruas comerciais e shoppings, com casos pontuais de aglomeração e risco de contágio em alguns locais mais populares. Porém, nada do que se vê pode ser comparado ao antigo normal para esta época.
A FecomercioSP (Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo), por exemplo, projeta para o varejo estadual uma alta de 1% no faturamento de dezembro – o pior resultado para o mês desde 2015, quando houve queda de 4,3%.
Segundo Altamiro Carvalho, assessor econômico da entidade, houve uma diluição, ao longo do ano, de pagamentos de benefícios que poderiam impulsionar as vendas.
O 13º benefício de aposentados do INSS, por exemplo, foi liberado entre abril e junho.
Trabalhadores de empresas que aderiram à medida provisória da suspensão do contrato de trabalho tiveram redução no valor do abono natalino.
No caso de informais e desempregados, o auxílio emergencial, que garantiu a retomada do comércio no meio do ano, quando a parcela era de R$ 600, chega às festas com metade do valor e não será prorrogado.
“Em termos de projeção, este é o pior ano da história”, afirmou Carvalho. “Foi um ano errático, e 2020 só não será pior do que 2014 e 2015 [quando houve impacto da recessão].”
Carvalho destaca que as projeções indicam alta nas vendas de alguns produtos normalmente ignorados no Natal e queda na procura de itens que costumam fazer sucesso.
“Este mês de dezembro e este Natal são totalmente atípicos”, disse. “Projeções apontam que material de construção terá crescimento de 43%, autopeças e acessórios para veículos, de 25%, enquanto as vendas nos supermercados tendem a ter crescimento de 15% apenas em dezembro.”
Enquanto isso, explica, vestuário e calçados não reagem e tendem a fechar o ano com retração de 37%.
Para Cardoso, o distanciamento social e as reuniões com um número menor de familiares devem ajudar lojas de móveis e decoração. Segundo ele, a tendência de cuidar mais do lar, que ganhou força na pandemia, tende a ser uma inspiração na hora da escolha de presentes.
Lojistas, que estão na linha de frente do balcão, vislumbram dificuldades. Pesquisa do Sindilojas-SP (sindicato de lojistas da cidade) mostra que, para 53% dos comerciantes, as vendas de Natal neste ano serão inferiores às do ano passado, enquanto 33% estimam que o faturamento permanecerá igual. Apenas 14% estão otimistas e projetam a retomada nas vendas.
Nos shoppings, a preocupação é idêntica. De acordo com Luís Augusto Ildefonso, diretor de relações institucionais da Alshop (Associação Brasileira de Lojistas de Shopping), lojistas de centros de compras dizem que já será bom se venderem 70% do que conseguiram no ano passado.
Existe até a expectativa de aumento no número de clientes perto do Natal, mas sem efeito expressivo no resultado.
“Em muitos lugares a pandemia voltou a avançar, e as pessoas estão contidas”, afirma. “Algumas até podem sair para fazer uma ou outra compra, mas não esperamos uma avalanche.”
Ildefonso afirma que o investimento em ecommerce, feito pela maioria dos lojistas durante a pandemia, está mais estruturado e poderá ser mais bem aproveitado no Natal. “A grande sacada para o Natal deste ano é o comércio eletrônico, e o lojista foi se preparando para esse momento ao longo de toda a pandemia”, disse.
Outro diferencial realizado pelos shoppings neste ano, segundo a Alshop, é o investimento em vendas do tipo clique e retire: o cliente compra pela internet e se dirige ao shopping apenas para buscar o produto. “Os shoppings neste ano estão mais aparelhados para drive-thru: a pessoa compra eletronicamente, passa na loja ou no estacionamento e já pega o produto.”
A CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo) até está mais otimista. Revisou a projeção de crescimento das vendas de 2,2% para 3,4% em nível nacional. De acordo com Fabio Bentes, economista da entidade, caso a projeção se confirme, o comércio nacional deverá movimentar mais de R$ 38 bilhões.
No entanto, lembrou que, historicamente, as vendas nas véspera do Natal estão perdendo força no calendário do varejo. Uma das razões é a popularização da Black Friday.
“Comparando o varejo com outros setores, como o de serviços, vemos uma recuperação relativamente mais rápida, mas não teremos daqui para a frente um crescimento em ritmo tão forte como ocorreu nos últimos meses.”
O avanço nos casos de Covid-19 é uma das coisas para a perda de fôlego. Desde 30 de novembro, o estado de São Paulo, por exemplo, voltou para chamada a fase amarela em relação à abertura de empresas. Na prática, ocorre redução no horário de funcionamento do comércio, o que limita o horário de compras para o consumidor.
De acordo com Jorge Dib, diretor da Univinco (União dos Lojistas da Rua 25 de março), a medida impactou as vendas de Natal, mas o comércio digital é suporte.
“Depois do segundo turno das eleições municipais, o pessoal voltou a ficar em casa, e os lojistas estão recorrendo aos canais digitais para melhorar as vendas”, disse.
Durante a semana, a rua 25 de Março, um dos comércios mais populares de São Paulo, estava bastante movimentada. No entanto, o volume de pessoas não se comparava às multidões vistas nesta época do ano, em especial na ladeira Porto Geral –rua que dá acesso à região pelo metrô.
“Parece um mês normal, e não dezembro”, disse Alex Oliveira, ambulante que vende camisetas na região. “Olha, até as lojas grandes estão vazias.”
O controle de circulação era muito flexível na maioria das lojas. Os Armarinhos Fernando eram uma das poucas lojas que mediam a temperatura na entrada e ofereciam álcool em gel. Havia também controle na entrada, mas, no horário em que a reportagem esteve lá, não havia fila.
Quem saiu para ir às compras disse à reportagem que, no geral, neste ano o Natal será enxuto: menos convidados e menos presentes.
“Estou comprando lembrancinhas só para os mais próximos”, contou Elaine Freitas, que é autônoma.
Segundo ela, o Natal sempre foi uma reunião de famílias para muitos: reunia mas 40 pessoas, entre familiares e amigos. Neste ano, porém, ela diz que limitou o encontro para um pequeno grupo de dez pessoas mais próximas.
Caren Mello, que vende caixas de MDF e vai na região a cada dois meses para comprar o material, conta que sua festa será econômica sob todos os aspectos. Ela pretende gastar cerca de R$ 400 neste ano, metade do que desembolsou em 2019. “Até o gasto com a comida ficou menor porque seremos apenas meu marido, meu filho e eu”, afirmou.
A família da vendedora Daniela Karine resolveu o problema de presentes organizando um amigo secreto de canecas.
“Em anos anteriores a gente dava perfume, roupa, calçado, mas neste ano vamos fazer diferente porque nem todo o mundo está trabalhando.”
A costureira Luciana Oliveira foi até a 25 de Março comprar bonecas e dinossauros para os netos de 6, 3 e 2 anos – os únicos que receberão presente dela neste ano.
Ao todo, gastou R$ 300, bem menos que os mais de R$ 1.000 usados para agradar a parentes e amigos no ano passado.
A técnica de enfermagem Tatiana Ribeiro está desempregada e, com o fim do auxílio emergencial, também segurou os gastos. Foi à 25 de Março comprar o básico: chinelo e utensílio para a casa. Vai passar o Natal com a vizinha e o filho.
“Geralmente somos em 30 pessoas, mas neste ano, não tem condições.”