A derrubada dos decretos que aumentariam as alíquotas do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) pelo Congresso Nacional, na última semana, acendeu um alerta sobre o enfraquecimento político do governo Lula (PT) e suas perspectivas para as eleições de 2026, segundo avaliação de cientistas políticos.
O episódio marcou a primeira vez, desde o governo Collor, que um decreto presidencial foi anulado pelo Legislativo, e consolidou a aliança entre Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), presidente do Senado, e Hugo Motta (Republicanos-PB), presidente da Câmara em exercício, numa articulação vista como contrária ao Planalto.
Na Câmara, a medida que sustou os decretos foi aprovada por 383 votos a 98. No Senado, a aprovação se deu de forma simbólica, sem contagem de votos. Para a cientista política Beatriz Rey, da USP, o episódio simboliza o afastamento dos partidos da base aliada e indica que Lula enfrentará dificuldades para garantir apoio legislativo em sua tentativa de reeleição. “A falta de articulação política do governo terá consequências dramáticas nas eleições do ano que vem”, afirma.
Segundo Rey, Lula tem priorizado sua projeção internacional, negligenciando pautas urgentes no Congresso. Além disso, a relação entre o Executivo e o Legislativo estaria fragilizada em três pilares fundamentais: gestão da coalizão, articulação política e falta de abertura do Congresso ao diálogo.
A baixa popularidade do presidente também agrava o cenário. De acordo com a última pesquisa Datafolha, 40% desaprovam o governo Lula e apenas 28% aprovam, o pior índice dos três mandatos. Essa conjuntura dificulta a sustentação política no Parlamento, que tem votado contra interesses do governo mesmo entre partidos teoricamente aliados, como União Brasil, PSD, MDB, Republicanos e PP, que demonstram preferência pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP) como alternativa para 2026.
Entre abril e maio, Lula sofreu ao menos oito derrotas na Câmara, incluindo o rompimento de parte do PDT com o governo e a aprovação de projetos que afrontam decisões do STF. Em fevereiro, o Planalto tentou reagir trocando o comando da articulação política: Alexandre Padilha deixou a Secretaria de Relações Institucionais e foi substituído por Gleisi Hoffmann, então presidente do PT. No entanto, os problemas persistem.
Para o professor da FGV Marco Antonio Teixeira, o contexto atual é de insatisfação generalizada do Congresso, agravada pela reforma ministerial inconclusa e por uma pressão crescente por emendas parlamentares. Ele aponta que ser ministro perdeu atratividade frente à possibilidade de liberação direta de recursos para as bases eleitorais. “A combinação de baixa popularidade, falta de articulação e a voracidade por emendas tem um efeito devastador para o governo”, conclui.
Teixeira avalia ainda que a chamada frente ampla de 2022 dificilmente se repetirá em 2026. “Lula vai chegar à eleição com os aliados de sempre. O caso do IOF selou a piora da relação com o Legislativo”, afirmou. Ele também ressalta que a relação com Arthur Lira (PP-AL), apesar de marcada por desconfiança, ainda garantia cumprimento de acordos — o que não ocorreu nesse episódio.
Diante do cenário, analistas defendem que o próprio presidente Lula assuma a articulação direta com o Congresso, já que as tentativas anteriores falharam.